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quarta-feira, 4 de maio de 2016

Batismo no Espírito e nas águas em Paulo



O perigo que corremos quando estudamos esse debatido tema do batismo, com foco nas cartas paulinas, é uma aproximação ao texto carregada com nossos pressupostos, preconceitos, convicções e agenda teológica, ao invés de ouvirmos o ensinamento do apóstolo.

Nosso problema é que, mesmo nas treze cartas que temos do apóstolo Paulo, nós não temos tudo o que Paulo gostaria de nos ensinar sobre todos os tipos de assuntos, especialmente sobre esse motif, mas temos alguns dados que podem nos guiar.

Qual é o relacionamento entre o batismo nas águas e o batismo no Espírito? Alguns veem esse relacionamento tão próximo que associam um com o outro, dizendo que o Espírito é recebido no batismo das águas. Para outros, não há relacionamento nenhum, é uma mera questão de coincidência.

O segundo volume da obra de Lucas pode nos ajudar nessa questão. Seguindo as narrativas de Atos, será que temos um paradigma no capítulo 19.1-7, em que a vinda do Espírito ocorre em conexão com o batismo nas águas? Ou nosso modelo está em Atos 10, em que o batismo é uma resposta à vinda do Espírito?

Ainda temos outra questão a ser levantada. A questão da dinâmica e experimental vinda do Espírito, que faz parte do quadro maior sobre o que acontece quando uma pessoa é salva por Cristo. Gordon Fee mostra que há uma tradição substancial na igreja afirmando que a experiência do Espírito, ou um "batismo no Espírito" se preferir, tem uma disposição subsequente aos crentes em relação ao recebimento do Espírito no batismo, ainda que essa experiência subsequente tenha sido entendida de maneiras variadas (santificação, fortalecimento, confirmação).1 Essa interpretação usa como paradigma o capítulo 8 de Atos, em que a conversão é seguida do batismo, que é seguido tempo depois pelo batismo no Espírito.

Essas questões são tão vastas que não podemos lidar com elas detalhadamente nesse artigo, porque também precisaríamos analisar o restante do Novo Testamento para isso. Meu interesse nesse artigo é estritamente no testemunho paulino. Pelo fato de Paulo não ter dito muito sobre a segunda questão (batismo no Espírito), precisarei expandir minha pobre visão para ver se há alguma evidência paulina que simpatize com o conceito de "experiência subsequente".

As informações podem ser facilmente distorcidas. Paulo associa O Espírito com o verbo "batizar" em apenas um único texto, 1Co 12.13, e muito tem sido escrito sobre esse texto, e o desacordo entre teólogos é ainda maior.

Ambas as interpretações usam esse texto para provar e fundamentar seu raciocínio. Por isso irei oferecer uma análise detalhada com ambas as questões em mente.

O Espírito e o batismo nas águas
Na igreja primitiva, o batismo nas águas era a resposta imediata do crente ao ato salvador de Deus no Espírito.2 Por parecer que ambos possuem uma conexão intrínseca, muitos argumentam que O Espírito vem ao crente através do próprio ato do batismo, como uma consequência inexorável. O paradigma absoluto usado é o do próprio Jesus, com a descida do Espírito em forma de pomba após seu batismo. Os textos-chave são 1Co 6. 11; 12.13 e Tito 3.5.3

O erro dessa abordagem se encontra tanto no método como nos pressupostos. No método por falhar em perceber como prosseguir para descobrir a perspectiva de Paulo e nos pressupostos por simplesmente enfatizar uma experiência da igreja e jogar fora o restante das evidências como um todo.

Prosseguiremos nossa abordagem em três passos: 1. Olharemos cuidadosamente para 1Co 12.13 que associa (ou que pelo menos parece que associa) o Espírito e o batismo;4 2. Depois olharemos para os textos em que Paulo fala sobre o batismo de uma forma clara e não ambígua, e veremos se há alguma conexão com o Espírito e; 3. Veremos os textos em que Paulo fala sobre conversão em termos do Espírito e ver se o batismo pode ser pelo menos pressuposto.5

Batismo no Espírito em 1Co 12.13
Os reverendos Archibald Robertson e Alfred Plummer veem nesse texto um "aspecto social do batismo",6 mas podemos dar alguns passos a mais.

Nosso texto vem após uma afirmação dupla: "O corpo é um" e tem muitos membros, e então Paulo explica essa afirmativa dizendo que "em um só Espírito, todos nós fomos batizados, em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres e a todos nós foi dado de beber de um só Espírito".

Alguns veem a expressão "em um só Espírito, todos nós fomos batizados" como uma relação íntima entre ambos (batismo e Espírito), e outros veem a expressão "beber de um só Espírito" como a ação do mesmo após o batismo. Mas ao analisarmos o contexto, essas duas opções caem por terra.

No contexto Paulo discorda dos cristãos em Corinto sobre a natureza da verdadeira espiritualidade. É provável que os coríntios entendessem a "glossolalia" (falar em línguas) como a evidência que eles já haviam começado a falar a linguagem celestial (13.1), indicando que eles alcançaram um estado espiritual que os coloca acima da vida neste mundo.7 Porém, Paulo tem uma visão sobre espiritualidade diferente, que inclui discipulado que segue O Crucificado (2.1-3; 4.1-9).8

Paulo os corrige teologicamente no capítulo 12, mostrando que o foco exclusivo no dom de língua mal interpreta e não representa a natureza da igreja. Paulo argumenta que a unidade em meio à diversidade é a verdadeira prova da manifestação do Espírito entre eles, que é o ponto de quase todo o capítulo 12. No verso 13, elaborando o que ele disse no verso anterior, Paulo oferece um fundamento para a unidade, que é a experiência comum que eles tinham no Espírito.



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